Seguindo com o relato de nossa primeira participação na produção de um filme curta metragem, descreveremos agora o início de todo o trabalho de produção e a idealização do mesmo. Para isso contamos com a participação mais que especial de nosso amigo e parceiro nessa empreitada, o diretor e roteirista Hamilton Rosa Jr.

“Sempre fui fascinado pelo cinema. Não tanto pela diversão, mas de olho mesmo na magia por trás dos bastidores, pensando no trabalho do roteirista e do encenador orquestrando o espetáculo. Virei roteirista publicitário pela vontade de entender a engenharia que envolve tanto a confecção de uma história, como o registro de filmagem e depois sua edição e finalização. E passei os últimos 15 anos, exercitando-a, e sabendo que em algum momento, eu faria o salto para o cinema.
A questão fundamental que pega não é apenas filmar. Mas o que eu teria pra dizer? Que tipo de história eu gostaria de contar?
Deixei minha vivência criativa me apontar o caminho. Hoje percebo que tudo que escrevo segue um viés de estudo psicológico. Em Trala Land, meu quarto curta metragem, eu quis arriscar muito em torno desse conceito. Desde o primeiro tratamento do roteiro, até a décima versão, eu quis abolir a cenografia. Acho que o cinema é super escravo da cenografia. Ao contrário do teatro, por exemplo, em que se aceita a suspensão de uma realidade, o espectador não acata bem essa crença. Se um ator pisa no palco trazendo um cacto e afirma, que ali, naquele espaço, a partir de agora é o sertão do agreste, no teatro imediatamente essa ideia é aceita. O espectador de teatro navega nas águas da imaginação. No cinema, não. Com Trala Land, desde o início, eu pensei em desconstruir a direção de arte. O filme começa num café, se transfere para o ambiente da cidade e, em seguida, para um consultório médico. Dentro desse espaço, desenvolve-se um diálogo entre o protagonista e um médico e as paredes da realidade se dissolvem para toda a ação rolar dentro da cabeça do personagem. E tudo isso sem efeitos visuais.
Encontramos essas características num amplo galpão no Estação Cultura de Campinas, com um detalhe muito sedutor. O espaço, além de amplo, era dividido em dois níveis, com um mezanino e uma escada desembocando numa galeria bem extensa. Visitamos a locação e de cara pensei em usar o mezanino como o consultório, e a escada como metáfora para o momento em que o protagonista fizesse sua regressão. O descer da escada serviria como transição, mostrando que aquela extensa galeria não era mais o consultório, e sim uma viagem dentro da mente do protagonista.
Trala Land foi sem dúvida um projeto experimental, confiando muito em não entregar respostas prontas para o espectador.
Os atores selecionados para participarem dessa experiência sabiam que 80% do filme seria calcado no trabalho de composição deles. Isso porque Trala Land é um projeto que se passa num espaço de imaginação. Os atores, em especial o protagonista, vivido por Hélcio Henriques, tinham que tornar esse lugar convincente para o espectador. Por isso os ensaios foram extensos: trabalhamos dois meses apenas na composição dos personagens. O desenvolvimento de cada personagem tinha o seu calor, o seu desenho próprio, por isso, há vários planos sequências, que não interrompem a ação do elenco.
Não queríamos fragmentar as emoções, nada de picar a atuação dos atores na edição.
Nem sempre é possível se arriscar tanto no cinema, mas num formato de curta-metragem temos a liberdade de experimentar, testar os limites da linguagem, aprimorar a engenharia, para estar pronto: porque o primeiro longa, pode ter certeza, é questão de tempo, mas ele vem. Vai acontecer”.


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